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. Resíduos .

O que mais me dilacera é a dor física que a ausência trás. É a falta do abraço, das mãos dadas, da tentativa de me jogar na piscina. Essa sensação residual de que algo está sempre faltando. A minha rotina não é mais a mesma, o futuro deve ser todo planejado novamente, de maneira diferente. Essa falta de perspectiva, essa vida mal arranjada, fragmentada. Eu sem saber o que vou fazer com as lembranças que vivem arranhando as paredes, e você saindo pela porta que estava trancada. Eu recolhendo cada pedacinho de vida jogado pelas janelas pra não permanecer vazia, só pra ter o que guardar, só pra ter o que contar. Não que eu não tenha nada melhor pra fazer ou não me dê o valor, mas para me refazer é preciso primeiro se desfazer. De qualquer maneira, eu que achava que nunca mais te veria novamente, continuamos nos encontrando, na rua, no mercado, no bar favorito, quase todos os dias como uma amarga ironia. Irei cumprimentá-lo com um sorriso raso e um aperto de mão seguido de um abraço frouxo e você me dará um beijo na testa, como quem se lamenta da maneira que tudo aconteceu. E você vai reparar na minha impotência e em todo meu medo de já ter sido esquecida, então irá perceber toda a minha fragilidade e em quanto eu me desfaço e tento permanecer inteira. Mas você não vai ligar pra isso, vai achar mais um teatro onde eu sou a protagonista e você o que sempre sai primeiro de cena, desse cenário mal feito que a tanto tempo ameaçava cair. E passado alguns meses, conhecerei sua nova namorada, agirei como se fosse meramente um conhecido e com o passar do tempo pensaremos cada vez menos em nós, até nos esquecermos completamente. Quase. Incrível como aquele sorriso, pleno de significados se tornou tão importante quanto um comercial de pasta de dente. É essa capacidade de esquecer que me mantêm viva. E depois de um certo tempo, começo a procurar um novo amor até encontrá-lo, e juro que será definitivo até ele ir embora. 

- Jenny Guimarães - 

Um comentário:

  1. Agora que sei da realidade em seus textos fica "pesado" ler e fico de certa forma confuso de sentir beleza na tristeza alheia. Por outro lado sempre escolho livros autobiográficos, ou, biografias, gosto de pensar na verdade. Faz sentido gostar tanto do que tu escreves.

    Obrigado, mesmo, pelo comentário!Farei o melhor possivel para não deixar-te sem eles. Palavra de Escoteiro.

    Usei a palavra "amarga" no meu texto, ela define perfeitamente o sentido de abandono embora o gosta seja sentido por "dentro".

    Cheio de aspas.

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