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. A carta que eu não Mando .

Eu já te chamei de "meu", mas a definição desse pronome possessivo faz referência à pessoa no sentido de posse, mantendo uma estreita relação com os pronomes pessoais, indicando que alguma coisa ou alguém nos cabe ou nos pertence. E você, você nunca soube o que era ser de alguém, muito menos meu. 

E tantas foram as vezes que eu quis te ensinar. "Olha, você tem que me ligar só pra saber como eu estou ou como foi meu dia. E tem que sentir minha falta como se não nos víssemos há séculos, mesmo tendo passados apenas alguns minutos. E quando a gente se encontrar, você tem que me abraçar forte, me pegar no colo me girando no ar, com um sorriso imenso no rosto. Você tem que me amar, porque é isso que os namorados fazem." 

Mas você só me procurava quando queria afastar a solidão. No intervalo entre um namoro e outro, Carência confundida com saudade. E eu sempre estava aqui. Talvez pela falta de uma companhia melhor, ou porque eu era a única que aceitava suas condições. E eu te amei mesmo assim. Finjo que te esqueço todos os dias, tentando em vão me convencer que a vida vai ser melhor sem você, até seu telefonema sagrado de sexta-feira me convidando para tomar aquela cerveja de sempre, acabe com meus planos de não te lembrar.  

Eu só queria que você soubesse que aquele amor ainda está comigo. Que eu não queria ser apenas mais uma, como uma segunda opção. Que eu não sou aquela mulher forte e segura de si que eu demonstro ser. Que eu não sou o que pareço fora da casca. E que eu odeio quando se refere com esse seu tom preconceituoso e machista que precisa arrumar uma namorada virgem. Sua hipocrisia e imaturidade cegam você. Não te deixam enxergar quem sempre esteve ao seu lado, respeitando seu tempo, seu jeito, aceitando suas imperfeições, com defeitos e qualidades suportáveis.

Mas a verdade é que tudo um dia acaba. E você pode não acreditar, mas até mesmo amar, cansa. Se dedicar sem ter nada em troca, cansa. Insistir e não ser correspondido, cansa. Desperdício cansa. E eu, de tanto descrer em amores sem finais felizes, cansei de desperdiçar bem estar. Essa coisa bonita de dar sem receber funciona muito bem em rezas histórias de santos e demais evoluídos do planeta. Mas eu não moro em igreja, não sou santa, não evoluí até esse ponto e a partir de agora só vou te dar se você me der também.

. Simples Mente .

Hoje eu lembrei de você como faço sempre que passo em frente ao Teatro Odisseia onde nos conhecemos. O que me deixou mais impressionada e, confesso, feliz; foi o fato de não sentir absolutamente nada. É tão bom te ver e não te amar mais. Pensar em você e não morrer a cada pedaço vago de lembrança. Não dói mais ver que está feliz ao lado de outra. Ignoro sua existência vinte e quatro horas por dia, e nem mesmo a curiosidade de olhar seu perfil estraga o meu dia. Você simplesmente não vale a pena. Demorei pra perceber isso, mas agora eu sei. E todo aquele papo de que você não é intelectualmente suficiente pra mim, é pura verdade. Sua limitação cultural e sua tentativa fracassada de ser uma pessoa com assuntos interessantes foram as primeiras coisas que me fizeram acordar. Não só pelo fato de eu ter 23 anos e já estar me formando, mas porque você simplesmente não tem perspectiva. Mas eu te agradeço mesmo assim. Você me fez reconhecer que eu não preciso parecer burra pra ficar com alguém, nem preciso fingir que não sei falar sobre política ou futebol, enquanto você só falava merda. E não preciso mais concordar com tudo que um idiota fala só porque ele tem os bíceps mais lindos que eu já vi na minha vida. Muito menos preciso dizer que gosto de funk, porque rebolar a bunda era mais excitante que uma boa conversa sensata. O máximo que você podia me oferecer era um orgasmo e um beijo na testa. Por isso, pra mim, você simplesmente não vale a pena.